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Capítulo 5: A ladra misteriosa.

  Eram quinze horas. O Pink Cherry, o hostess club mais exclusivo de Crownia, ainda estava fechado ao público, mas exalava luxo e sensualidade em cada canto. Luzes vermelhas suaves já banhavam o ambiente, refletindo nas paredes espelhadas e nos trajes meticulosamente escolhidos dos funcionários que come?avam a circular.

  No segundo andar, em uma sala privada com vista para o sal?o principal, Maria estava recostada em um sofá de veludo escuro. Ao seu lado, Sasha — ou Vanessa, como só Maria ousava chamá-la — mexia nos cabelos com leve irrita??o.

  — Aquele cliente... Ele foi desrespeitoso de novo. Está insistindo. Ofereceu dinheiro pra me levar pra casa dele — disse Sasha, com um toque de nojo na voz. — Você precisa resolver isso.

  Maria passou os dedos pelos cabelos loiros de Sasha, com um gesto calmo e íntimo.

  — Vai ficar tudo bem, Vanessa — murmurou. A m?o deslizou com delicadeza pela nuca dela, aproximando-se lentamente. O beijo come?ou suave, quase como um sussurro entre os lábios. Sasha hesitou, mas logo fechou os olhos, se entregando com esfor?o contido. Seus movimentos eram tímidos, como se buscassem corresponder à intensidade de Maria sem ultrapassar seus próprios limites. Ainda assim, ela retribuiu com do?ura, permitindo que aquele momento se alongasse na tens?o tênue entre carinho e poder.

  Depois de um longo segundo de silêncio, Maria afastou os lábios lentamente e soltou um suspiro contido, como se quisesse que aquele momento durasse um pouco mais. Ela recostou levemente a cabe?a, mas manteve os olhos em Sasha, com uma express?o que mesclava ternura e pragmatismo.

  Maria suspirou, já sabendo a resposta, mas querendo ouvir da própria Sasha:

  — Estamos falando de Gaspar, n?o é?

  Sasha confirmou com um olhar carregado de frustra??o.

  — Aquele velho tarado n?o desiste. Está oferecendo cada vez mais dinheiro pra dormir comigo. Você devia dar um corretivo nele pra entender que eu n?o fa?o esse tipo de trabalho.

  — Ele te tocou? Passou dos limites?

  — N?o. Só fala, insinua. Mas me incomoda.

  Sasha cruzou os bra?os com for?a, o rosto emburrado e as bochechas levemente infladas, como uma crian?a contrariada. Havia raiva em seu olhar, mas expressa de um jeito quase adorável.

  — Você nunca faz nada quando é ele — resmungou.

  Maria reprimiu um sorriso e se inclinou ligeiramente.

  — Se ele n?o quebra as regras, estou de m?os atadas... ainda mais sendo o senhor Gaspar. é um cliente muito importante.

  Sasha permaneceu emburrada, mas seus olhos acompanharam os de Maria.

  — Falando nisso, ele disse algo interessante?

  — Na última noite, um dos homens dele falou sobre rotas e mencionou um tal de Douglas — respondeu Sasha, ainda emburrada, com os bra?os cruzados e o olhar desviado. — Mas Gaspar olhou pra ele de um jeito... e o cara parou na hora. Ele até deixou de falar comigo pra encarar o sujeito.

  Sasha descruzou os bra?os devagar, a express?o emburrada dando lugar a uma curiosidade sincera.

  — Esse Douglas... é aquele que sempre aparecia aqui com Federico? — Perguntou.

  — Vai saber.

  Um leve toque na porta. Maria ergueu o olhar, sem pressa.— O que é?Do outro lado, a voz de Marcel respondeu:— Eles est?o aqui.— Pode entrar — disse Maria.Marcel apareceu com o rosto parcialmente encoberto pela entrada.

  Maria assentiu.

  — Sasha, pode nos deixar por um momento?

  Ela obedeceu com relutancia.

  Ao sair, trocou um cumprimento animado com Ciel, que entrava junto de Arisa e Miku.

  — Me chama pra sair na folga, hein? — disse Ciel, com um sorriso meigo e os olhos brilhando de expectativa.

  Sasha se virou ao ouvir a voz dele e o sorriso emburrado que ainda restava em seu rosto se desfez. Ela acenou levemente com a cabe?a e respondeu, com um tom mais suave:

  — Pode deixar, Ciel. A gente combina direitinho depois.

  Ele fez um gesto animado com as m?os antes de entrar, e ela sumiu pelo corredor, ainda sorrindo, como se aquele breve momento tivesse melhorado seu humor por completo.

  Marcel fechou a porta com discri??o. Maria observou o grupo diante dela: Arisa, séria e confiante, vestindo um blazer sobre a camisa; por baixo do short, era possível ver suas pernas cobertas por tatuagens bem tra?adas, e seus olhos carregavam o olhar frio de uma predadora; Ciel, o top host da cidade, exibia o estereótipo completo de um idol masculino: cabelos impecáveis, postura carismática e um charme ensaiado que combinava com seu ar despreocupado, mas atento; e Miku, com longos cabelos pretos e mechas azuladas, usava uma camiseta oversized com estampa da Hello Kitty, short de couro e correntes sutis na cintura. Enquanto todos mantinham posturas rígidas e roupas impecáveis, ela parecia saída de outro mundo — colorida, relaxada e estranhamente eficaz. Estava com um copo de bubble tea em uma m?o e o celular na outra. Sugava a bebida sem pressa, os olhos fixos na tela, completamente alheia ao clima tenso da sala.

  — Miku, por favor — disse Marcel.

  Sem tirar os olhos da tela, Miku come?ou:

  — Andei monitorando mensagens. Tudo indica que o tal do Douglas saiu de cena. Sumiu geral.

  Arisa se virou para Maria.

  — Quer que eu verifique isso mais a fundo?

  Maria balan?ou a cabe?a.

  — N?o. As apreens?es est?o subindo. Se Rita está confiante o suficiente pra mobilizar efetivo extra, isso deve ter fundamento.

  Marcel cruzou os bra?os.

  — Raymond é ingênuo se acha que vai acabar com esse mercado antes que outro Rei tome o controle.

  Maria lan?ou um olhar a Ciel.

  — Talvez quem pense isso seja a Rita. Ela tem... senso de dever demais — comentou Ciel.

  — O que nos leva à próxima quest?o — disse Marcel. — E se tomarmos isso antes de Gaspar?

  Arisa p?s a m?o no queixo, pensativa.

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  — Se Gaspar mandar o Dante, já seria um problema difícil de lidar sem o Marcel, ou pior... se ele decidir outra pessoa... — Ela fez uma pausa repentina, e seu corpo enrijeceu por um instante. Um frio percorreu sua espinha, e seus olhos perderam o foco por um segundo.

  Todos na sala sentiram o peso da pausa de Arisa. Um breve silêncio pairou, carregado de tens?o.

  Miku, no entanto, continuou distraída com o celular, indiferente ao clima. Deu mais um gole em seu bubble tea e falou com tranquilidade:

  — Gaspar tá obcecado com alguém que pregou uma pe?a nele. Sérvulo tá lidando com isso.

  Arisa sorriu de canto e olhou para Maria.

  — Pode ser a nossa chance.

  — é bom agir logo — acrescentou Miku, ainda olhando para o celular. — Pelo jeito, o Sérvulo tá bem perto de pegar o alvo dele.

  Maria olhou para Marcel, que apenas assentiu.

  — Sim, madame — disse ele, entendendo sem precisar de explica??es.

  — Arisa, mantenha contato com Marcel. Organizem os novos negócios o mais rápido possível.

  — Com licen?a — disse Arisa, levantando-se.

  Marcel fez o mesmo. Ambos deixaram a sala.

  Maria se virou para Ciel.

  — E o outro assunto?

  Ciel passou a m?o nos cabelos de Miku.

  — Nossa ratinha diz que eles est?o se dando bem.

  Miku permaneceu em silêncio por um instante, ainda fingindo concentra??o na tela do celular. Mas um leve sorriso surgiu no canto dos lábios e seu rosto ficou levemente vermelho. Ela abaixou o olhar por um segundo, tentando disfar?ar, antes de voltar a sugar seu bubble tea com um ar casual.

  — ótimo — respondeu Maria, recostando-se com um sorriso discreto.

  Já tarde da noite, a brisa fria da parte sul de Crownia trazia um cheiro salgado do mar enquanto Elsa caminhava silenciosamente por uma viela escura que levava ao pequeno cais de concreto. A névoa se acumulava ao redor das estruturas abandonadas, e o som das ondas quebrando suavemente contrastava com o silêncio opressor do local. O cais, pertencente a Gaspar, era usado como entreposto para armazenar bens de valor e itens diversos.

  O lugar estava estranhamente calmo, sem guardas ou qualquer sinal de movimenta??o, o que imediatamente despertou a desconfian?a de Elsa.

  Ela olhou para os lados, os olhos atentos farejando armadilhas invisíveis. Ent?o, com agilidade e precis?o, escalou um muro alto de concreto que cercava parte do complexo, pulou-o com facilidade e pousou suavemente do outro lado, como uma gata, quase sem fazer ruído.

  Apoiando-se na parede, ela respirou fundo, observando o ambiente por alguns segundos antes de seguir adiante. Só ent?o come?ou a testar as chaves obtidas na casa de jogos, uma por uma, com movimentos cuidadosos e treinados. O primeiro galp?o parecia trancado com um sistema antigo; Elsa tentou as chaves, mas nenhuma encaixava.

  Ela seguiu para o segundo, onde a fechadura estava coberta de ferrugem, e precisou for?ar uma das chaves que girou em falso com um estalo seco. No terceiro galp?o, após experimentar duas chaves, finalmente sentiu um estalido discreto sob os dedos. Um leve sorriso surgiu em seus lábios.

  Após várias tentativas frustradas, uma das portas finalmente cedeu com um clique suave. Elsa entrou na sala escura e, com um sorriso vitorioso, acendeu uma pequena lanterna. A luz cortou a penumbra, revelando dezenas de obras de arte meticulosamente embaladas e empilhadas: quadros de molduras douradas, esculturas envoltas em panos grossos, e até pe?as antigas de porcelana oriental.

  Seus olhos brilharam com satisfa??o. Caminhou lentamente entre as pilhas, analisando com cuidado o que poderia carregar. Separou dois quadros de tamanho médio e os colocou ao lado da porta.

  Depois, retirou uma faca curta de debaixo da manga da jaqueta de couro, examinou mais algumas molduras e, com um sorriso travesso, come?ou a rasgar as telas com cortes precisos. A cada obra destruída, ria discretamente, como se tirasse prazer em estragar algo valioso demais para estar ali. A ideia de causar prejuízos a Gaspar a divertia imensamente. O som do tecido se rompendo se misturava ao seu deleite silencioso enquanto seguia o ritual caótico.

  Ela pegou os dois quadros que havia separado e voltou para o cais, sentindo o ar frio bater contra o rosto. Porém, mal teve tempo de reagir. Um vulto surgiu das sombras e, antes que pudesse entender o que acontecia, um soco violento acertou seu abd?men.

  O impacto a fez voar por vários metros, rolando pelo ch?o áspero do cais enquanto os quadros escapavam de seus bra?os e se espatifavam à distancia. Elsa tentou recuperar o f?lego, mas a dor era intensa.

  A figura que surgia das sombras era esguia, com cabelos loiros desgrenhados que caíam sobre a testa. Os olhos azuis, afiados como laminas, reluziam sob a fraca luz do cais, e seus lábios desenhavam um sorriso perturbador. Seu andar era lento, calculado, como um predador que já sabia que havia vencido.

  — Acho que vi uma gatinha — brincou ele, andando devagar, o sorriso perturbador nunca deixando seu rosto.

  Elsa se for?ou a levantar, apoiando uma m?o no ch?o enquanto pressionava o abd?men com a outra. O ar saía com dificuldade por entre os dentes cerrados, e uma dor terrível se espalhava por sua barriga, como se algo tivesse se rompido por dentro. Ofegante, com os olhos semicerrados, ela se colocou de pé com esfor?o, as pernas vacilando por um segundo antes de reencontrar o equilíbrio.

  A luta come?ou ferozmente. Elsa partiu para o ataque com a faca em punho, tentando compensar a dor com agressividade. Ela avan?ou com rapidez surpreendente, desferindo cortes na dire??o do oponente, mirando pontos vitais com precis?o.

  Mas o homem esguio desviava com facilidade, os olhos azuis brilhando com um prazer sádico.

  — Isso, continue dan?ando — murmurou ele, com o mesmo sorriso perturbador.

  Ele golpeava Elsa com brutalidade calculada, atingindo o ombro, a lateral das costelas, e depois a coxa, sempre evitando áreas letais. Queria fazê-la sofrer, prolongar o jogo. A cada ataque, Elsa cambaleava mais, tentando se manter em pé.

  Ela rangia os dentes, tentando reagir, mas o corpo já n?o obedecia. A dor no abd?men se somava às novas contus?es, e seu f?lego se tornava cada vez mais curto.

  Num último impulso, ela tentou enfiar a faca no flanco dele, mas ele agarrou seu pulso com for?a e a torceu com crueldade, fazendo a lamina cair de sua m?o.

  — Tsc... achei que fosse durar mais — disse ele, prestes a dar o golpe final.

  Quando parecia o fim, um enxame escuro irrompeu no céu noturno. Uma revoada de corvos mergulhou contra o agressor, cercando-o numa distra??o frenética. Incomodado, ele soltou Elsa para espantar os pássaros, girando com violência a lamina em arco. Um a um, os corvos foram cortados no ar, mas o movimento o deixou momentaneamente exposto.

  Enquanto caía de joelhos, Elsa viu ao longe a silhueta de um homem de capuz surgir sobre o muro. Em um movimento rápido e preciso, ele sacou uma arma e disparou dois dardos que voaram rente à escurid?o, acertando o corpo do inimigo com um leve estalo seco. O homem esguio vacilou, os olhos arregalados por um instante, enquanto o corpo come?ava a fraquejar, os músculos respondendo cada vez menos.

  Elsa n?o hesitou. Aproveitou o momento e come?ou a correr com dificuldade, sem olhar para trás. Viu o homem encapuzado pular o muro com agilidade. Assustada, correu em outra dire??o e também saltou sobre o muro, desaparecendo do cais.

  O homem loiro n?o chegou a cair. Permaneceu de pé, mas cambaleante, o corpo come?ando a ceder sob o efeito dos tranquilizantes. Após alguns segundos, sua respira??o voltou a se estabilizar, mas os olhos azuis, antes carregados de prazer, agora ardiam em fúria silenciosa.

  Com um grunhido, ele bateu com for?a o pé no ch?o. O impacto gerou um estrondo que reverberou pelo cais, rachando o concreto e formando uma pequena cratera ao seu redor. Seu corpo ainda estava dormente, mas o olhar era assassino.

  Com movimentos lentos, ele retirou um celular do bolso. Levou o aparelho ao ouvido, aguardando alguns segundos até a chamada ser atendida.

  — Ela escapou.

  Alguns minutos depois, já mais afastada, Elsa caminhava pelas ruas da zona sul de Crownia. O asfalto ainda úmido refletia o brilho colorido dos letreiros de neon que piscavam em silêncio, tingindo as po?as d’água com tons de rosa, verde e roxo. As cal?adas estavam praticamente vazias, com exce??o de um ou outro andarilho apressado, envolto em casacos pesados, desviando o olhar como se evitasse problemas. Em certos cruzamentos, o som distante de sirenes ecoava, misturando-se ao zumbido dos painéis digitais e ao ronco eventual de uma moto solitária.

  Elsa se manteve nas sombras, atenta, sentindo o peso dos próprios passos ecoarem entre os prédios altos e silenciosos. As luzes da cidade pareciam vivas, observando-a de cima. Depois de dobrar duas esquinas e atravessar uma passarela vazia sobre a avenida principal, ela encontrou um prédio de aparência antiga e escura, cercado por outros edifícios altos.

  A estrutura do prédio rangia com o vento noturno, e o elevador parecia n?o funcionar há anos. Sem perder tempo, ela subiu as escadas estreitas e mal iluminadas, degrau por degrau, sentindo cada batida do cora??o contra as costelas doloridas. Quando finalmente alcan?ou a cobertura, foi recebida por um cenário de concreto gasto, encanamentos enferrujados correndo pelas bordas e caixas metálicas empilhadas próximas a uma torre de ventila??o.

  Alguns cabos soltos balan?avam com o vento, e uma antena antiga emitia estalos ocasionais. Havia também uma velha caixa-d'água sustentada por estruturas metálicas, e restos de madeira amontoados em um canto. Elsa se apoiou no parapeito com ambas as m?os e respirou fundo, tentando estabilizar a respira??o ofegante e o turbilh?o de adrenalina que ainda circulava em seu corpo.

  — Eu aceito um agradecimento por ter salvo sua vida — disse uma voz masculina nas sombras.

  Mirio apareceu com um sorriso leve nos lábios. Elsa cerrou os dentes e avan?ou para ele, mancando levemente e levando a m?o ao abd?men por um breve instante antes de desferir uma sequência rápida de golpes — socos, chutes, investidas desesperadas, movidas mais por orgulho ferido do que por tática.

  Mirio, no entanto, desviava com a mesma calma de quem observa um treino infantil. Ele girava o corpo com leveza, inclinava o tronco, levantava os bra?os num gesto relaxado, desviando de cada ataque com precis?o elegante. Quando necessário, usava o antebra?o ou a palma da m?o para bloquear, absorvendo o impacto com fluidez, como se estivesse dan?ando com a violência dela. Seus pés se moviam com leveza sobre o concreto, quase sem som, como se o confronto fosse uma coreografia montada apenas para seu entretenimento.

  — Tá valendo pontos de estilo — provocou, rindo.

  Elsa tentou um chute giratório, mas Mirio segurou seu tornozelo com facilidade. Aproveitando o impulso, ela girou o corpo no ar numa tentativa de acertá-lo com o outro pé, mas ele a soltou no momento exato e se inclinou para trás com gra?a, desviando do golpe por centímetros.

  Ela caiu com leveza, mas n?o perdeu tempo — levantou-se rangendo os dentes, suando, a respira??o entrecortada. Um dos bra?os tremia ligeiramente, e ela apertava os lábios para conter um gemido de dor, sentindo os músculos retesados a cada movimento.

  Lan?ou mais dois socos em sua dire??o, ambos bloqueados com a palma da m?o dele, que agora sorria com um brilho zombeteiro no olhar.

  — Sabe... se n?o tivesse levado aquela surra do Sérvulo antes, talvez fosse até difícil te acompanhar.

  Mesmo enfraquecida, Elsa n?o recuava. O suor escorria pela testa, e seus movimentos já n?o tinham a mesma precis?o; vez ou outra, ela apoiava o peso brevemente em uma das pernas, como se buscasse aliviar a dor. A cada nova tentativa de ataque, sentia o cansa?o se acumulando nos ombros e nas pernas, como areia enchendo um recipiente até o topo. Seu peito subia e descia com for?a, os pulm?es implorando por ar. Um leve tremor passou por sua m?o direita, e ela o ignorou, avan?ando mais uma vez.

  Mirio a deixava golpear, bloqueando cada tentativa com o mínimo de esfor?o, como se estivesse avaliando sua determina??o — ou se divertindo com a fúria dela. O olhar dele era t?o provocador quanto leve, como o de alguém que sabe que n?o precisa se esfor?ar para vencer.

  Em um último movimento inesperado, Elsa agarrou Mirio pelas golas do casaco, puxando-o bruscamente para perto. Mirio arqueou uma sobrancelha, curioso, o sorriso ainda nos lábios — claramente se perguntando o que ela pretendia. Quando seus rostos ficaram próximos, Elsa manteve os olhos nos dele por um breve instante, como se desafiasse sua leitura. Ent?o, sem aviso, o puxou para um beijo feroz e impulsivo.

  Os lábios de ambos se encontraram com for?a, e Mirio, pego de surpresa, soltou um breve suspiro antes de se entregar ao gesto. Elsa pressionou a boca contra a dele com intensidade, os corpos colados, como se cada movimento quisesse desafiar a resistência de ambos. A língua dela encontrou a dele num embate t?o súbito quanto o beijo, e por um instante, Mirio cedeu — um suspiro escapando entre os lábios entreabertos.

  Ele envolveu sua cintura com uma das m?os, puxando-a ainda mais para si, enquanto a outra subia lentamente pelas costas dela, explorando com um toque firme e envolvente. Seus dedos deslizaram pela curva da nuca dela, aprofundando o contato. Por alguns segundos, o concreto, o vento e até o gosto metálico do sangue pareciam distantes.

  Mas Elsa mantinha os punhos cerrados.

  Quando sentiu o corpo dele completamente entregue ao momento, ela flexionou levemente os joelhos e desferiu um golpe seco com o punho fechado bem no abd?men de Mirio. O impacto foi certeiro. Mirio arqueou o corpo para frente, soltando o ar num único som abafado, caindo de joelhos com uma express?o de dor no rosto.

  Com um salto ágil, ela desapareceu para o telhado adjacente e sumiu na noite.

  Mirio permaneceu ajoelhado por alguns instantes, respirando fundo e franzindo a testa enquanto massageava o local do golpe. Um leve sorriso ainda brincava nos lábios, apesar da dor evidente. Com esfor?o controlado, apoiou uma das m?os no ch?o e a outra na coxa, erguendo-se devagar, como quem saboreava a própria derrota parcial.

  Só ent?o, de pé, voltou o olhar para o horizonte, observando Elsa desaparecer ao longe.

  — Agora eu sei. Eu quero você no meu jogo — murmurou. — Desde que sua loucura n?o te mate antes.

  Mirio e Elsa.

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