A floresta densa ao redor ecoava o som ensurdecedor dos tambores de guerra. N?o eram tambores comuns, mas colossais, gravados com intrincadas runas que pulsavam a cada batida, como se amplificando-as através da mana. Cada pulsar reverberava no ch?o, enviando ondas de tens?o para o próprio cora??o do exército em marcha.
Mais de três mil guerreiros avan?avam com rostos endurecidos para onde sabiam que a vitória os esperava. O port?o principal de Insídia era o alvo. Apesar de todas as defesas e do fosso ao redor, aquele ponto era a entrada mais vulnerável na fortaleza. O plano era simples: destruí-lo e invadir a cidade, abrindo caminho com pura for?a esmagadora.
A moral estava alta, e as armas dos ca?adores, afiadas e refletindo a luz do amanhecer, criavam uma imagem poderosa. Escudos brilhantes, lan?as erguidas e espadas reluzentes se moviam com anima??o.
Seus inimigos tinham mais que o dobro de seus números, com uma popula??o estimada em mais de dez mil habitantes. No entanto, os soldados confiavam na superioridade estratégica e no intenso treinamento militar que os definia. Mesmo armados, o povo de Insídia era composto, em sua maioria, de civis adaptados à vida cotidiana. Tal disparidade fazia os olhos dos ca?adores de Barueri brilharem com a oportunidade clara de glória fácil.
Havia também o fato de que, embora os corrompidos fossem abundantes, a muta??o que os afetava privava muitos deles de habilidades cruciais que a humanidade pura possuía. Muitos n?o apresentavam características físicas ou habilidades vantajosas no campo de batalha e, acima de tudo, haviam perdido a capacidade de manifestar mana, uma limita??o crítica que os colocava em ainda mais desvantagem.
— Tem alguma coisa errada — murmurou um dos soldados, sua voz quase inaudível em meio às intensas batidas das botas contra o solo.
Tal frase foi apenas o início dos muitos sussurros inc?modos que preencheram o ar. No come?o, notaram apenas alguns vultos espreitando nas bordas da forma??o, t?o rápidos que podiam ser confundidos com sombras projetadas pelas árvores. Mas, aos poucos, os vultos se multiplicaram, e os ca?adores piscavam continuamente, achando que aquilo podia ser uma simples ilus?o.
— Mantenham o ritmo!
O general Roldan, líder da guilda dos Brutos de Ferro, estava responsável pela lateral direita do exército. Sua postura era firme e imponente, mas até ele sentia o peso daquela atmosfera opressiva. Foi em meio a tentativa de manter a ordem, que, de repente, um grito cortou o ar.
— Aaaah!
Os tambores cessaram, e o silêncio pesado se instalou, envolvendo os soldados como um véu de chumbo. Apenas as respira??es pesadas e o leve ranger das armaduras quebravam o clima tenso. Aquele que havia gritado n?o estava mais lá; seu lugar estava vazio, e a vegeta??o ao redor tremia violentamente.
— O que foi isso? — murmurou um dos capit?es, seus dedos apertando o punho da espada até os nós dos dedos ficarem brancos.
A resposta foi apenas um longo uivo, um som que rasgou o ar como uma lamina, fazendo com que até os soldados mais experientes segurassem o ar por um instante. Logo outros uivos se juntaram, um coro crescente e amea?ador que parecia vir de todas as dire??es. Os soldados de Barueri come?aram a trocar olhares de apreens?o, cada um tentando entender de onde o ataque viria.
— Lobos Cinzentos! Eles nos cercaram! — alguém bramiu, recuando instintivamente, mas sendo repentinamente pego antes que pudesse reagir.
Os olhos da criatura eram ferozes e penetrantes, o soldado tentou desferir um golpe de retalia??o, mas ela desviou com uma agilidade inesperada, atacando de volta e cravando os dentes no bra?o dele. Ele gritou, sentindo o osso quebrar sob a press?o da mordida, e caiu no ch?o enquanto o lobo o arrastava para os arbustos.
Em apenas um segundo a floresta inofensiva se transformou em um verdadeiro pesadelo. Cenas semelhantes ao primeiro ataque eram vistas por todos os lados, com sangue manchando a vibrante vegeta??o. De forma organizada, os lobos isolaram pequenos grupos, separando-os da forma??o principal. As tropas dos puros, que momentos atrás eram uma for?a ordenada e unida, agora se fragmentavam, cada um tentando defender-se como podia.
— Formem um círculo! Protejam-se! — bradou o general Roldan, tentando manter a calma e reunir seus homens.
Os soldados tentaram obedecer, unindo-se para criar uma barreira defensiva, mas os lobos eram astutos. Eles sabiam exatamente onde atacar. Moviam-se nas sombras, atacando com precis?o e ferocidade, desaparecendo t?o rapidamente quanto surgiam. Os soldados ergueram seus escudos, mas o impacto ainda assim foi esmagador. As garras afiadas rasgavam as armaduras, e as presas, t?o fortes quanto metal, cravavam-se na carne em um frenesi selvagem.
Os inimigos n?o eram apenas animais; eram guerreiros por direito próprio, cada um disposto a se sacrificar pela ordem do lobo alfa. Eles corriam entre as fileiras, e mesmo quando feridos e sangrando, continuavam a lutar, a morder e dilacerar, como se a dor fosse apenas um detalhe.
A cacofonia de violência se espalhou pelo campo. Humanos e feras caíam, suas vozes criando uma atmosfera opressiva que parecia engolir a própria floresta. Jasmim se movia entre os ca?adores, e em um instante, encontrou-se lado a lado com Roldan, ambos com express?es de determina??o e uma pitada de divers?o fria em seus olhos.
— Parece que resolveram nos atacar com tudo logo de início, hein? — Roldan sorriu, o sarcasmo pingando de sua voz enquanto erguia a lamina para bloquear um golpe lateral.
— Um ataque desesperado de criaturas idiotas — Jasmim replicou, enquanto cortava o ar com um golpe preciso, sua lamina arrancando a perna de um lobo que ousou chegar perto demais. O animal caiu com um grito rasgado, mas o olhar da líder de guilda já estava fixo nos próximos oponentes. — Vamos acabar com isso de uma vez.
Ela ergueu a voz, dominando o ruído do campo de batalha ao seu redor.
— Forma??o Escudo Prateado! — ordenou. Imediatamente, os ca?adores sob seu comando come?aram a se alinhar, criando uma muralha de escudos e lan?as que bloquearia qualquer avan?o frontal.
Roldan observou os ca?adores de Jasmim assumirem a posi??o e riu, chamando a própria guilda ao combate com um tom ir?nico e desdenhoso. Mesmo com os contínuos abates, o panico n?o havia tomado conta de suas fileiras. Sabia que seus ca?adores eram bem treinados o suficiente para resolver a situa??o.
— Vamos lá, brutos! Organizem-se! Abram espa?o para os Jóqueis!
Enquanto falava, ele manteve o olhar fixo nos lobos, observando-os com um ceticismo crescente. As feras se moviam com uma precis?o estranha para criaturas ditas irracionais.
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— Acha que eles est?o criando essas feras? Se tiverem domadores nas fileiras, as coisas podem se complicar um pouco.
— Já ouviu falar de algum domador vivendo nas redondezas? — perguntou Jasmim em tom de zombaria. — Pelo que soube, nem mesmo na capital tem muitos deles.
— Você está certa. Devo estar pensando demais — riu Roldan, terminando de organizar suas tropas.
Seus esquadr?o central, os Jóqueis, montados em grtandes monstros de armadura pesada, iniciaram um intenso cavalgar, formando uma carga devastadora. Estavam apenas girando por entre as árvores, sem rumo, mas mesmo isso já era o suficiente para esmagar os ossos dos lobos que ousaram entrar em seu caminho.
Em outros locais, as demais guildas iniciavam suas próprias estratégias, mantendo a mesma calmaria da dupla de líderes. Na ala esquerda do exército, a Guilda dos Grifos avan?ava com a for?a de uma rajada de vento. Em um ataque devastador, os cavaleiros leves perseguiram diretamente as feras com afiadas lan?as, dispersando-as por alguns segundos. Ao fundo, os Silenciosos se juntaram a guilda Ventos Livres, se fazendo de iscas para que poderosas flechas atravessassem os flancos das criaturas.
Jasmim tomou a dianteira, e sua muralha de escudos avan?ava diretamente para qualquer criatura que se aproximasse com for?a implacável. Partes das criaturas eram decepadas sem hesita??o, e seus cranios esmagados em seguida, como se n?o passasse de uma tarefa banal para seu grupo.
Manipuladores de mana em todas as cinco guildas acabaram por se reunir no centro, criando prote??es diversas quando possível. Os animais eram rápidos, ágeis demais para que as suas manifesta??es os acompanhassem. Desta forma, eram incapazes de enfrentar os lobos em combate direto, deixando tudo para os guerreiros na linha de frente.
Aos poucos, o ataque, que come?ou com uma grande quantidade de baixas dos puros, tomou o rumo contrário. As duas centenas de lobos cinzentos enviados por Insídia ainda avan?avam com ferocidade contra as forma??es das guildas, no entanto, cada vez mais rapidamente come?aram a cair sob as afiadas armas dos humanos.
Claro, mesmo na morte iminente, garantiriam que sempre ao menos um soldado fosse arrastado com eles para o túmulo, como se um pacto cruel estivesse selado entre os dois lados. Garm observava de longe, uma apreens?o pesada nublando seu olhar.
Ele sabia que aquela investida era, como Ana insistiu em deixar claro, apenas um sacrifício, parte de uma estratégia maior; o objetivo alinhado com os demais conselheiros era que deveriam derrubar ao menos quinhentos soldados inimigos antes de recuar. Mesmo n?o sendo uma quantidade t?o grande, já era mais que o suficiente para um batalh?o de criaturas rank C. Mas ouvir os gritos agoniados de seus companheiros, os gemidos sangrentos e os rosnados de fúria, fazia o cora??o do lobo negro apertar com uma dor que ele jamais admitiria em voz alta.
A tens?o acumulada transbordou. Garm rosnou, seus músculos se enrijecendo. Em um salto poderoso, ele lan?ou-se à frente, seu corpo imenso aterrissando no meio do campo de batalha com a intensidade de uma tempestade. Vendo a aproxima??o, um dos ca?adores de posi??o elevada, assustado, tentou dar um golpe com sua lan?a, mas o lobo desviou, avan?ando rapidamente sobre ele e derrubando-o no ch?o. Com uma mordida precisa, Garm rasgou o capacete do homem, expondo seu rosto antes de atacá-lo de novo, destro?ando sua face como se despejasse seu reprimido e feroz ódio.
Logo voltou a saltar em dire??o a outros grupos. Mesmo quando juntos, suas garras dilaceravam armaduras e carne em um movimento fluido e brutal. Suas investidas eram calculadas, eliminando vários soldados antes que qualquer um conseguisse revidar. Sempre que o perigo se intensificava, Garm recuava para se reposicionar, mantendo-se em movimento constante, um verdadeiro predador no caos.
Entre um avan?o e outro, soltava altos uivos, dando ordens para os dispersos lobos menores se reorganizarem. Sempre que o fazia, outras dezenas de uivos ecoavam, distribuindo as orienta??es por todo o local. Cada fera rapidamente mudava de posi??o, e seus padr?es se tornavam aos poucos cada vez mais refinados.
Eles estavam se adaptando, fazendo até mesmo a firme forma??o Escudo Prateado come?ar a ceder sob a press?o constante dos ataques coordenados. A tática dos Ventos Livres, que antes mantinha os lobos à distancia, come?ou a falhar, pois as feras haviam aprendido a ignorar os movimentos ilusórios. E mesmo os Brutos de Ferro, que avan?avam com fúria implacável, foram for?ados a recuar para manter sua linha, enquanto os Grifos eram flanqueados pelas feras.
A floresta tornara-se um jogo de xadrez, onde cada lado ajustava suas táticas em tempo real para eliminar o máximo de inimigos possíveis. Foi em meio a este frenesi que o olhar do líder lobo finalmente se cruzou com o de Jasmim.
Por um momento, ambos ficaram parados, como se o tempo houvesse congelado ao redor deles. A líder da guilda arregalou os olhos, surpresa ao ver o lobo gigante ali, lutando pelo inimigo. Seus pensamentos corriam enquanto ela varria o campo de batalha com os olhos, procurando por uma figura familiar. Foi ent?o que avistou Lúcia, lutando muito ao fundo, alheia à presen?a de seu antigo companheiro.
“Se o lobo está lutando pelos mascarados… ent?o Ana deve estar lá também”, pensou ela, deduzindo rapidamente o contexto da presen?a do animal na linha de frente.
Um sorriso trai?oeiro curvou seus lábios.
— Eu devia ter te matado logo nos primeiros dias, lobo.
Garm a encarou por um instante, indeciso sobre disparar em sua dire??o ou n?o. Manteve passos laterais, circundando a líder da guilda, pronto para disparar no menor sinal de abertura.
— N?o lobo. Me chamo Garm.
A express?o de Jasmim ficou repentinamente fria, e sua espada se ergueu em dire??o à grande fera.
— Olha só… Quem diria que você evoluiria a ponto de conseguir falar em apenas um ano… — come?ando a correr, a mulher ergueu a voz. — Todos! Foquem no lobo negro!
A instru??o de Jasmim foi obedecida sem hesita??o. Em segundos, as centenas de ca?adores dos Escudos de Pétalas convergiu contra Garm. Flechas zumbiam em sua dire??o, cada uma mais precisa que a anterior. Guerreiros se lan?avam contra ele, lan?as e espadas em punho. Garm se movia com agilidade, desviando dos ataques com saltos e ocasionalmente se defendendo com suas próteses, mas o cerco se fechava rapidamente. Ele sabia que n?o poderia enfrentar aquela investida direcionada por muito tempo.
Após derrubar mais alguns inimigos, com um rosnado frustrado, recuou, abrindo uma passagem em meio aos soldados, deixando um rastro de corpos abatidos enquanto a exaust?o come?ava a pesar em seus músculos.
Um último uivo de comando soou, e os poucos lobos restantes se reagruparam, correndo ao seu lado a uma velocidade absurda de volta para a cidade. Atrás deles, os ca?adores eliminaram os que n?o conseguiram escapar com uma frieza implacável.
Os minutos pareciam passar devagar, e ao conseguirem finalmente retornar, Garm saltou com seu pequeno grupo, de apenas uma dúzia de sobreviventes, para a caverna oculta abaixo da ponte.
“O sacrifício de vocês n?o será em v?o”, pensou o grande lobo para si mesmo, Ele sabia que precisava sobreviver para liderar os que restavam, e mesmo em meio à tristeza pela perda de tantos subordinados, sua determina??o era inabalável.
Com um último esfor?o, derrubou as paredes de entrada, selando o local. N?o podia deixar que o acesso ao subterraneo da cidade chegasse às m?os do inimigo.
“Espero que tenhamos conseguido fazer o suficiente, Ana…”
Indiferentes aos passos pesados do lobo, a n?o tantos quil?metros de distancia, o som dos tambores voltou a ecoar, como uma trilha macabra que acompanhava a alta moral dos ca?adores após a aparente vitória inicial, reiniciando a marcha em dire??o aos altos port?es da cidade mascarada.
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