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Capítulo 113 - Memento Lupino

  — A… na.

  O lobo finalmente come?ou a se mover, cada passo um arrastar lento e ponderado. Seus olhos n?o deixavam os da guerreira, e a mandíbula tremia enquanto repetia seu nome em um esfor?o inquietante.

  — An… Anaa…

  A mercenária observou enquanto a criatura mantinha firmemente presa em suas garras um pequeno animal, lembrando um urso em miniatura. Parecia inerte, arrastado pela terra, com os pelos sujos e desfigurados. O lobo, apesar de sua forma grotesca e disforme, mostrava uma inteligência estranha em seus movimentos.

  Cada fibra do corpo de Ana estava preparada para o combate, mas algo em sua curiosidade a fez parar. Em vez de atacar, ela deixou a lamina cair, a deixando repousar ao lado enquanto lentamente vestia suas luvas de ferro. Os dedos revestidos de metal fecharam-se e abriram-se algumas vezes, preparando-se para qualquer a??o necessária.

  A criatura avan?ou até estar a poucos passos de distancia. Suas garras seguravam firmemente o cadáver, e ele permaneceu parado, encarando-a com uma mistura de expectativa e ansiedade. Quando a mulher n?o reagiu, o lobo baixou a cabe?a e mordeu com for?a a perna do animal, arrancando-a com um movimento brutal. A carne foi ent?o levada até Ana, batendo em seu peito em um gesto estranho e ritualístico.

  — Pre… sen… te… — a palavra saiu de sua garganta, arrastada e engasgada, uma mistura de fala e rugido, enquanto a saliva escorria pelos cantos de seus lábios.

  Ana estreitou os olhos, estudando a oferenda. Em seguida, um sorriso surgiu em seus lábios, um sorriso estranhamente caloroso. Pegou a carne estendida e, sem hesitar, a mordeu, rasgando um grande peda?o com seus dentes. O sangue escorreu por sua gartganta, e ela mastigou lentamente, como se estivesse degustando um vinho fino.

  — Nada mal — murmurou entre mastigadas, seus olhos brilhando com uma faísca de aprova??o enquanto ela dava outra mordida.

  O lobo soltou um som gutural que parecia quase um riso. N?o o riso sinistro e amea?ador que Ana estava acostumada a ouvir de tais criaturas, mas um som genuíno, carregado de uma estranha alegria. Sua postura se modificou, os músculos tensos relaxaram, e ele balan?ou, para os lados, quase como em uma dan?a. Havia uma inesperada vivacidade em seus olhos, tornando o ser horripilante quase fofo.

  — Se… guir.

  Ele se virou, caminhando para dentro da floresta, parando de vez em quando para olhar por cima do ombro, como se a encorajasse a ir na mesma dire??o.

  A rainha observou-o por um instante, as engrenagens em sua mente girando. Pegou outro peda?o da carne e o comeu com calma, ponderando suas op??es. Ela lan?ou um olhar para Miguel, que ainda estava à distancia, e percebeu que seus olhos por trás da máscara sorridente estavam quase implorando silenciosamente para que ela n?o fosse atrás do animal.

  — Sempre t?o previsível... — murmurou para si mesma, um sorriso lento e cruel se formando em seus lábios.

  Jogando o restante da carne no ch?o, Ana estalou as juntas dos dedos, como se estivesse se aquecendo para uma nova empreitada. E ent?o come?ou a correr atrás do lobo. Ele a esperou por um segundo, observando sua aproxima??o com os olhos reluzindo de satisfa??o, antes de disparar pela mata, suas patas se movendo silenciosas e rápidas entre as árvores retorcidas.

  Os minutos de corrida se estenderam, com apenas o som de folhas esmagadas chegando aos ouvidos da duplas, mas logo outros monstros come?aram a se juntar à corrida, seus uivos preenchendo o ar com uma cacofonia que vinha de todas as dire??es, um chamado que parecia vir de uma grande alcateia.

  Finalmente, chegaram a uma estranha caverna. Sua entrada era enorme e o vento assobiava ao atingir suas bordas, trazendo um intrigante mistério para a constru??o natural. A criatura que a guiara se afastou para um canto da abertura, observando-a. Ana também parou, e verificando os arredores percebeu o círculo crescente de lobos que come?ava a formar-se ao seu redor.

  Alguns exibiam um olhar de pura curiosidade, outros de hostilidade e, é claro, havia os que a observavam com olhos famintos. Ela n?o se sentiu amea?ada, apenas abaixou-se e come?ou a brincar com um galho no ch?o, entediada com toda a situa??o. Enfrentar todos eles parecia difícil, mas n?o conseguia mais vê-los como um perigo real.

  Se fosse para morrer nas m?os de um inimigo que ela mesma havia derrotado há anos, seria um destino justo por sua incompetência.

  Mesmo assim, seus sentidos estavam em alerta total; ela tinha certeza que seria atacada a qualquer momento. Seus olhos, embora aparentassem calma, eram os de um predador, n?o de uma presa.

  Como esperado, foi aenas uma quest?o de segundos. Uma criatura maior que as outras e com saliva escorrendo dos dentes afiados, finalmente deixou de resistir ao instinto, lan?ando-se em sua dire??o com um salto hesitante, mas atrevido.

  Ana n?o se preocupou. Lembrava-se claramente dos padr?es de ataque dessas criaturas. Enquanto ele caía em dire??o ao solo, infundiu um fio de mana em seu equipamento, uma medida para proteger a integridade da arma ao endere?ar o metal ao máximo.

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  O lobo tentou se estabilizar ao notar a estranha postura, mas n?o teve tempo, pois rapidamente ela saltou, levando o joelho diretamente ao encontro de sua mandíbula. A for?a do impacto foi devastadora, o som dos ossos se partindo ecoou pela clareira, uma nota final em uma melodia de violência.

  O monstro foi arremessado para trás, seu focinho deformado, afundado em seu próprio rosto. Ele caiu no ch?o com um gemido angustiado, ainda vivo, mas evidentemente ferido e humilhado. Arrastou-se para longe com um estranho lamento, sangue escorria da boca aberta em um grito silencioso.

  As outras bestas ficaram ainda mais indecisas, sem conseguir reagir à for?a e à velocidade da visitante, mas as mais corajosas já haviam come?ado a se movimentar. Quando outro lobo finalmente saltou, Ana se preparou para contra-atacar, replicando seu último golpe, mas sua aten??o foi desviada por um vulto enorme que saiu da caverna.

  "Rápido!", pensou a mulher, maravilhada com a incrível velocidade enquanto mudava sua posi??o, pronta para desviar.

  No entanto, o vulto n?o a atacou. Ele agarrou o lobo cinzento pelo pesco?o no ar e, com um estalo seco, quebrou-lhe a espinha, jogando o corpo ao ch?o como se fosse um brinquedo quebrado. O sangue escorreu pelas presas da criatura, contrastando com o verde da vegeta??o, enquanto pousava à frente de Ana, revelando-se.

  Seu olhar era feroz, selvagem ao extremo, e seu pelo negro como carv?o era entrecortado por cicatrizes que percorriam todo o corpo. Sua mandíbula era uma fus?o entre carne e metal, reluzindo como se contivesse estrelas presas em sua composi??o.

  — Muito maior do que me lembrava — murmurou Ana, vendo a criatura que tinha quase o dobro do tamanho de um cavalo de guerra, uma figura colossal e imponente.

  De canto de olho, reparou também que a criatura mancava devido a uma ausência significativa; sua perna dianteira direita estava mutilada, quase inexistente apesar de n?o tornar seus movimentos menos firmes, já que cada passo continuava ecoando com autoridade.

  Os outros lobos se abaixaram ou recuaram, temendo o lobo negro. Ele grunhiu em aprova??o, e logo encarou Ana. Parecia estar medindo a mulher mascarada a sua frente, cada músculo em seu corpo pronto para atacar, e por um momento pareceu que ele a devoraria ali mesmo.

  A mercenária n?o recuou. Ao invés disso, estendeu as m?os de forma admirada em dire??o ao focinho da fera, seus dedos se movendo com uma delicadeza inesperada. O grande animal estremeceu sob o toque, e em seguida farejou levemente a humana, antes de, p?r fim, abaixar-se um pouco e enterrar o rosto em seu ombro, como uma crian?a buscando o conforto da m?e.

  — Você passou por muita coisa, hein? — sussurrou Ana, a voz suave, mas carregada de respeito. Ela olhou ao redor para os outros lobos, que agora assistiam em silêncio. Havia uma compreens?o silenciosa entre ela e a matilha. — Mas parece que está se saindo bem.

  Após uma volta do ponteiro médio do relógio, o soltou de seu abra?o, e o lobo hesitou por um momento, como se n?o quisesse se afastar. A rainha sorriu com o comportamento e deu um último tapinha em seu espesso pelo, deslizando a m?o até a parte onde a perna fora decepada, imaginando a história por trás das marcas cruéis de uma batalha.

  — Você me lembra um velho amigo — disse, sua voz carregada de um misto de tristeza e nostalgia.

  O lobo deu um leve rosnado, um som que soou mais uma resposta do que uma amea?a. Ele se virou e voltou para a escurid?o da caverna, movendo-se com uma gra?a que contrastava com seu tamanho massivo.

  Entendendo o convite, ela o seguiu de perto, cada passo afundando no ch?o coberto por um tapete de musgo e ossos. O cheiro forte de sangue logo atingiu suas narinas, mas n?o a incomodava. O lobo se acomodou em um local onde um fino fio de luz atravessava uma rachadura na rocha, iluminando parte de sua figura. Mesmo deitado, ele era gigantesco, fazendo-a ter que olhar para cima para poder enxergar sua face.

  Ana encontrou um canto livre de restos e se sentou de pernas cruzadas, observando-o com curiosidade. O local estava silencioso, exceto pelo som ocasional de gotas d'água caindo das estalactites.

  — E ent?o, lobo, você também fala, certo? Quem come?a?

  A criatura ergueu a cabe?a, seus olhos selvagens fixando-se nos de Ana. Quando finalmente respondeu, sua voz era um som gutural, profundo e ressoante, como se viesse das profundezas da terra.

  — N?o sou apenas um lobo. Meu nome é Fenrir.

  A mercenária arqueou uma sobrancelha, o calor em seu olhar desaparecendo, substituído por um gelo cortante. Ela cruzou os bra?os, inclinando a cabe?a para o lado como se estivesse examinando um inseto.

  — Já é difícil aceitar você falando. N?o vou aceitar um nome clichê.

  A resposta direta fez o lobo se encolher por um instante. Após uma considera??o interna, tentou novamente, com o tom de amea?a retornando a sua voz.

  — Ent?o… sou Skoll!

  Ana n?o se deu ao trabalho de responder. Seu olhar perfurou o lobo, e ela tamborilou os dedos no ch?o com impaciência, fazendo-o sentir uma pontada de medo crescer dentro de si.

  — Lupus? — sugeriu o lobo, sua voz agora vacilando, incapaz de conter a inseguran?a.

  Ana revirou os olhos.

  — é o nome de uma doen?a — respondeu ela, secamente.

  O animal ficou sem palavras, imóvel, sem saber como continuar. Ana suspirou profundamente, inclinando-se para trás, apoiando-se nos cotovelos.

  — Eu mere?o... — murmurou para si mesma. — Já que insiste em algo sem criatividade, você será Garm, o maior dos caninos.

  A rea??o do lobo foi imediata. Seus olhos se iluminaram, e ele abanou a cauda com um entusiasmo quase infantil, claramente satisfeito com o nome. Ainda assim, uma dúvida o corroía, e ele n?o p?de deixar de perguntar.

  — Mas... n?o é o mesmo que Fenrir?

  Ana deu de ombros, desinteressada.

  — Tanto faz…

  Exausta pela intera??o, a rainha se jogou de costas no ch?o, encarando o teto da caverna. A ideia de ter um lobo falante ao seu lado, principalmente um que parecia, sabe-se lá como, conhecer sobre mitologia, era algo que exigiria muito mais do que sua já escassa paciência poderia lidar naquele momento.

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